Autor: Alexander A. de Mello - Advogado OAB/RS 92.327
A saúde suplementar no Brasil é um setor vital, regulado pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), autarquia federal responsável por normatizar, controlar e fiscalizar as atividades que garantem a assistência suplementar à saúde. Um dos pontos de maior conflito entre operadoras de planos de saúde e beneficiários reside na aplicação dos reajustes anuais das mensalidades. A notícia que circula e merece a devida análise jurídica é clara: reajustes que não seguem as diretrizes estabelecidas pela ANS são, de facto, ilegais.
A legalidade dos reajustes está intrinsecamente ligada à observância das normas regulatórias e dos princípios do Código de Defesa do Consumidor (CDC), que coíbem cláusulas abusivas e o desequilíbrio contratual. Este artigo visa esclarecer os diferentes tipos de reajustes, as regras da ANS e a consolidada jurisprudência que protege o consumidor contra a onerosidade excessiva.
A mensalidade de um plano de saúde pode sofrer três tipos principais de reajuste, cada um com regras específicas de aplicação e fiscalização [1]:
Nos planos individuais e familiares, a regra é mais rígida. A ANS estabelece um teto máximo de reajuste anual, e qualquer percentual aplicado acima deste limite é manifestamente ilegal. O beneficiário tem o direito de exigir a aplicação do índice oficial e a devolução dos valores pagos a maior, geralmente em dobro, conforme o parágrafo único do art. 42 do CDC, quando comprovada a má-fé da operadora [2].
O grande foco de litígio reside nos planos coletivos (empresariais e por adesão), que, em tese, possuem reajuste anual por livre negociação e por sinistralidade, desvinculado do teto da ANS para planos individuais. Contudo, a jurisprudência pátria tem atuado de forma contundente para coibir o reajuste abusivo, mesmo nestes contratos.
A ausência de fiscalização direta da ANS sobre o percentual não confere às operadoras um cheque em branco. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) e o Supremo Tribunal Federal (STF) têm reiterado que a aplicação de índices desproporcionais, sem a devida transparência e demonstração atuarial da variação de custos ou da sinistralidade, configura abuso de direito e viola a boa-fé objetiva [3].
Em casos de reajustes exorbitantes em planos coletivos, o Poder Judiciário tem intervindo para:
1.Anular o reajuste por falta de clareza e justificativa [4].
2.Substituir o índice aplicado pelo índice máximo estabelecido pela ANS para planos individuais, como forma de restabelecer o equilíbrio contratual [5].
Uma das mais importantes vitórias dos consumidores contra reajustes abusivos é a recente consolidação do entendimento do STF sobre o reajuste por faixa etária para idosos.
Em decisão histórica, o Supremo Tribunal Federal (STF) formou maioria para decidir que os reajustes por faixa etária aplicados após os 60 anos são indevidos para todos os tipos de planos, independentemente da data de contratação [6]. Essa decisão reafirma a proteção do Estatuto do Idoso (Lei nº 10.741/2003), que proíbe a discriminação do idoso nos planos de saúde pela cobrança de valores diferenciados em razão da idade [7].
Portanto, qualquer reajuste por mudança de faixa etária que incida sobre o beneficiário após os 60 anos de idade é considerado ilegal e passível de anulação judicial, com a consequente restituição dos valores pagos indevidamente.
A premissa de que "reajustes que não seguem as diretrizes estabelecidas pela ANS são ilegais" é uma verdade jurídica que se aplica de diferentes formas aos diversos tipos de contratos. Seja pela desobediência ao teto nos planos individuais, seja pela falta de transparência e abusividade nos planos coletivos, o beneficiário não está desamparado.
Diante de um reajuste considerado abusivo, o consumidor deve:
1.Documentar o histórico de pagamentos e o aviso de reajuste.
2.Buscar orientação de um advogado especialista em Direito da Saúde.
3.Ingressar com Ação Judicial para a revisão do contrato, anulação do reajuste ilegal e a restituição dos valores pagos a maior.
O Poder Judiciário, amparado pelo CDC e pela legislação específica, tem sido o guardião do equilíbrio contratual, garantindo que o direito à saúde suplementar não seja inviabilizado por práticas financeiras abusivas e unilaterais das operadoras.
[1] Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). Cartilha de Reajuste de Planos de Saúde. Disponível em: [URL da Cartilha da ANS, se possível]. [2] Brasil. Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990. Código de Defesa do Consumidor. [3] Superior Tribunal de Justiça (STJ). Jurisprudência sobre Reajuste Abusivo em Planos Coletivos. [4] Migalhas. Juiz anula reajustes por sinistralidade em plano por falta de clareza. Disponível em: [URL do Migalhas sobre sinistralidade]. [5] Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT). Reajuste de mensalidade – plano de saúde coletivo. Disponível em: [URL do TJDFT sobre reajuste coletivo]. [6] Supremo Tribunal Federal (STF). STF afasta os reajustes de faixa etária após os 60 anos. Disponível em: [URL do Migalhas sobre STF e idosos]. [7] Brasil. Lei nº 10.741, de 1º de outubro de 2003. Estatuto do Idoso.