Autor: Alexander A. de Mello - Advogado OAB/RS 92.327
O ambiente de trabalho, idealmente um espaço de colaboração e desenvolvimento, pode, por vezes, se transformar em um palco de violência psicológica. O assédio organizacional é uma das formas mais insidiosas dessa violência, pois não se restringe a um conflito interpessoal isolado, mas sim a uma prática sistemática e estrutural, muitas vezes impulsionada pela própria cultura ou gestão da empresa [1].
Este artigo visa oferecer uma visão didática e fundamentada sobre o assédio organizacional, diferenciando-o de outras formas de assédio, explorando suas consequências devastadoras e apresentando o arcabouço legal brasileiro para seu combate.
Diferentemente do assédio moral individual (vertical ou horizontal), que se manifesta em ataques diretos de um indivíduo a outro, o assédio organizacional é uma violência coletiva e impessoal. Ele é caracterizado por práticas de gestão que, embora possam parecer neutras ou focadas em produtividade, resultam em sofrimento psíquico e degradação das condições de trabalho para um grupo de empregados ou para toda a organização [2].
O assédio organizacional não exige a intenção direta de um superior hierárquico em prejudicar um subordinado específico. Ele surge, muitas vezes, de uma cultura de pressão excessiva, metas inatingíveis, controle rígido e constante, ou a implementação de métodos de gestão desumanizantes que visam a maximização do lucro a qualquer custo [3].
Embora o assédio organizacional seja uma categoria que engloba a violência de gestão, ele se relaciona diretamente com os tipos mais conhecidos de assédio no trabalho:
É a manifestação mais comum do assédio organizacional. Envolve a exposição dos trabalhadores a situações humilhantes e constrangedoras, de forma repetitiva e prolongada, no exercício de suas funções. No contexto organizacional, isso se traduz em:
•Pressão por Metas: Imposição de metas irrealistas, acompanhada de ameaças veladas ou explícitas de punição ou demissão [4].
•Controle Excessivo: Monitoramento constante e invasivo, como o uso de softwares de vigilância ou a exigência de disponibilidade ininterrupta.
•Desqualificação do Trabalho: Atribuição de tarefas inúteis, inferiores ou a retirada de instrumentos de trabalho, visando a desmoralização coletiva.
Embora o assédio sexual seja tipicamente individual, a cultura organizacional pode ser um fator facilitador. Uma empresa que tolera piadas de cunho sexual, comentários inapropriados ou não possui canais de denúncia eficazes cria um ambiente propício para que o assédio sexual prospere, caracterizando uma falha grave de gestão e responsabilidade organizacional.
A legislação brasileira tem evoluído para reconhecer e combater o assédio no ambiente de trabalho, responsabilizando a empresa por sua ocorrência:
A CLT não tipifica diretamente o assédio, mas suas consequências são tratadas. O assédio moral ou sexual pode configurar falta grave do empregador (Art. 483, alínea "e"), permitindo ao empregado a rescisão indireta do contrato de trabalho e o recebimento de todas as verbas rescisórias, além de indenização por danos morais [5].
Esta lei alterou a CLT para tornar obrigatória a inclusão de regras de prevenção e combate ao assédio sexual e a outras formas de violência nas normas internas da Comissão Interna de Prevenção de Acidentes e de Assédio (CIPA) [6]. As empresas com CIPA são obrigadas a:
1.Incluir temas de assédio nas atividades e treinamentos da CIPA.
2.Fixar regras de conduta com sanções para o assédio.
3.Criar canais de denúncia eficazes e anônimos.
4.Garantir o sigilo e o acompanhamento das denúncias.
As consequências do assédio organizacional são vastas e atingem tanto o indivíduo quanto a própria saúde financeira e reputacional da empresa.
O impacto na saúde do trabalhador é profundo, podendo levar a quadros graves de saúde mental e física [7]:
•Saúde Mental: Ansiedade, depressão, síndrome do pânico, burnout, estresse pós-traumático, perda de autoestima e insônia.
•Saúde Física: Dores de cabeça, problemas gastrointestinais, hipertensão e enfraquecimento do sistema imunológico.
•Carreira: Queda de produtividade, desmotivação, pedidos de demissão e dificuldade de recolocação profissional.
O assédio organizacional é um fator de risco que compromete a sustentabilidade e a imagem da empresa:
•Financeiras e Legais: Condenações judiciais por danos morais e materiais, multas trabalhistas e custos com afastamentos e licenças médicas.
•Produtividade: Aumento do turnover (rotatividade de pessoal), absenteísmo, queda na qualidade dos produtos/serviços e perda de talentos.
•Reputacionais: Dano à imagem da marca empregadora, dificuldade em atrair novos talentos e perda de confiança de clientes e parceiros.
O combate ao assédio organizacional exige mais do que a punição de agressores individuais; requer uma transformação cultural e a adoção de políticas de gestão que priorizem o bem-estar e o respeito. A ilegalidade do assédio não reside apenas na violação de leis específicas, mas na afronta aos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e do valor social do trabalho.
As empresas que investem em canais de denúncia transparentes, treinamentos contínuos e uma liderança humanizada não apenas cumprem a lei, mas constroem um ambiente de trabalho mais produtivo, ético e sustentável.
[1] TRT4. Assédio Moral e Organizacional. Disponível em: [URL do TRT4 sobre Assédio Moral e Organizacional]. [2] Migalhas. Entenda o que é assédio organizacional. Disponível em: [URL do Migalhas sobre Assédio Organizacional]. [3] Graziele Cabral. O que é assédio organizacional e como combatê-lo?. Disponível em: [URL do Graziele Cabral sobre Assédio Organizacional]. [4] Contato Seguro. Conheça os principais tipos de assédio no ambiente de trabalho. Disponível em: [URL do Contato Seguro sobre Tipos de Assédio]. [5] Brasil. Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943. Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). [6] Brasil. Lei nº 14.457, de 21 de setembro de 2022. Institui o Programa Emprega + Mulheres. [7] Contato Seguro. Efeitos do assédio na saúde física e mental do colaborador. Disponível em: [URL do Contato Seguro sobre Efeitos do Assédio].